Um coração com nova batida

Geral
São Lourenço do Oeste | 30/10/2013 | 13:53

Autor e foto: Angela Maria Curioletti

O relógio já marcava próximo da meia noite quando o telefone tocou e, do outro lado, uma voz embargada que disse: “Amor, vão fazer”. Era dia 10 de junho, uma segunda-feira, e meu coração começou a palpitar já sabendo do que se tratava. Pausei o filme que estava assistindo e me concentrei na informação, que não era nada banal.

Meu noivo (ou marido, caso prefiram, pois moramos juntos a mais de dois anos) tem 31 anos e estava prestes a ser submetido a um transplante de coração. Sim, exatamente isso. Já fazia quase duas semanas que ele estava internado na Policlínica Pato Branco, uma entre tantas outras internações que se iniciaram em abril deste ano, quando a boa notícia chegou.

Na terça-feira, dia 11 de junho, véspera do Dia dos Namorados (quer melhor presente que o meu?), ele foi levado para a UTI onde o prepararam para a cirurgia. Gentilmente, a equipe da Policlínica Pato Branco me deixou ficar ao lado dele, motivando-o, passando mensagens positivas e, como não é diferente entre a gente, rindo muito. Quando o relógio marcou 10h30 pediram para que eu saísse do quarto, pois chegava o momento dele. Só voltei a vê-lo no fim do outro dia.

O que eu, repórter do Diário do Sudoeste, conto neste breve relato é a experiência de vida que tenho passado ao lado do meu marido durante há dois anos, aproximadamente.

O ocorrido

O nome dele é Arnoldo Weise, sofreu um infarto em 10 de setembro de 2011, com 29 anos, apesar de nunca ter apresentado sintomas, mas uma vida sem controle na alimentação, aliada à falta de exercícios e ao cigarro, já é um indicador.

No dia em questão ele acabara de chegar de uma viagem – trabalhava como motorista – e foi fazer uma trilha de moto com os amigos, atividade que, sempre que havia tempo, praticava. Logo nos primeiros minutos sentiu um mal-estar e abandonou o lazer. Estando na cidade dos pais, ele foi para a casa deles, tomou um banho e depois disso foi ao hospital, onde descobriu que estava enfartando.

O primeiro atendimento ocorreu na cidade de Quilombo/SC, que o encaminhou para Xanxerê/SC, onde realizou uma angioplastia - cirurgia realizada para desobstruir a artéria, utilizando um minúsculo balão na ponta de um catéter, insuflado dentro da artéria que está obstruída com placas de gordura e sangue.
Resumindo: de lá para cá foram muitos exames, muitas internações, os problemas de saúde só aumentando, e nós na esperança de que um dia tudo isso se resolveria.

Como ficou tudo

O cardiologista Dr. Paulo Roberto Giublin, de Pato Branco, foi o responsável pelo transplante, que somente neste ano realizou seis, um resultado muito positivo, na visão do médico.

Após quatro meses da cirurgia, é Arnoldo quem conta como se sente: “Eu já não sabia como era estar bem. Em todo o tempo antes da cirurgia tinha dificuldades para andar, respirar, para dormir e até para comer, mas não visualizava outra condição, porque não me lembrava como era ter uma vida normal. Lembro-me de ter entrado na sala de cirurgia, e depois disso mais nada, nem mesmo as primeiras conversas já no quarto da UTI. Acredito que a recuperação tenha sido rápida, inclusive pela conversa com os médicos e a reação sempre de espanto dos familiares e amigos (risos)”.

Arnoldo também conta sobre a primeira semana: “Quase não mexia a cabeça. No segundo dia comecei a me alimentar normalmente, no terceiro fiquei sentado e, quando vi, já estava de pé e tomava banho sozinho. Mas foram seis dias na UTI até chegar ao quarto. Basicamente tive que reaprender a andar e até a respirar, tudo era novidade. No total, foram 25 dias de internação, e eu não via a hora de voltar para casa, mas sei de tudo o que passei, que não foi um processo simples e que temos que aproveitar cada momento de nossa vida”.

Aos médicos Giublin e Rinaldo Wolker, este também cardiologista, Arnoldo diz que só tem a agradecer por toda a paciência e empenho em sua recuperação, além, claro, de toda a equipe de profissionais da Policlínica Pato Branco, que são muitos, “e fica impossível lembrar o nome de todos”, explica.
Para a família, “um amor infinito, que só aumenta a cada dia, ainda mais com um coração novo”, brinca Arnoldo.

Mas, a recuperação continua e os medicamentos ainda estão sendo controlados e medidos, assim como a alimentação e a rotina de exercícios.

A importância de doar

Assim como Arnoldo, muitas pessoas acabam recebendo uma nova chance de vida através de doadores anônimos, por meio de suas famílias. Este gesto não deve ser único, isolado, deve ser repetido e multiplicado para que boas ações ocorram diariamente porque, assim como muitos, eu, repórter e esposa, também achei que esta situação nunca aconteceria comigo.

Balanço de transplantes no Brasil

O número de doadores de órgãos no Brasil dobrou nos últimos dez anos e, com isso, também o número de cirurgias: de 7.500 transplantes realizados em 2003 para 15.141 em 2012. Os números fazem parte do balanço divulgado pelo Ministério da Saúde no fim de setembro deste ano, quando também foi apresentada a nova Campanha Nacional de Doação de Órgãos. Na ocasião, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, assinou ainda duas portarias para qualificar e ampliar a oferta de transplantes do país.
Mais de 50% das famílias brasileiras, ao perder um ente, são favoráveis à doação de órgãos. Este é o maior índice de aprovação à doação do mundo. A aprovação da população à doação subiu de 6,5% em 2003, para 13,5% em 2012.

A tendência reflete-se na diminuição da espera pela cirurgia em todo o país. Em 2010, havia 59.728 pacientes aguardando na fila do Sistema Brasileiro de Transplantes. Eram pessoas que já estavam prontas para a cirurgia e em avaliação médica. Já em 2013, houve uma redução de 35% neste número, passando para 38.759 (até junho) pessoas em espera.

No transplante de coração, por exemplo, houve um aumento de 61% no país no primeiro quadrimestre de 2012. Foram 71 cirurgias neste mesmo período. De fígado foram 507, pulmão 22, rim 1.641, pâncreas 30 e rim/pâncreas 34, córnea 5.054 e medula óssea 647.